Fiscalidade ▸ Rendimentos de capitais, rendimentos prediais e incrementos patrimoniais
Incrementos patrimoniais
Os incrementos patrimoniais são tributados em sede de categoria G de IRS, a qual consiste numa categoria de natureza residual que resultou da unificação da categoria G (mais-valias) e da categoria I (Outros Rendimentos). A natureza residual da categoria G decorre da circunstância de serem nesta tributados todos os rendimentos que não sejam tributados no âmbito das outras categorias de IRS (artigo 9. ° do CIRS).
A designação incrementos patrimoniais abrange assim múltiplas (e distintas) realidades: 1) as mais-valias; 2) as indemnizações que visem a reparação de danos não patrimoniais, excetuadas as fixadas por decisão judicial ou arbitral ou resultantes de acordo homologado judicialmente, de danos emergentes não comprovados e de lucros cessantes, considerando-se neste último caso como tais apenas as que se destinem a ressarcir os benefícios líquidos deixados de obter em consequência da lesão; 3) as importâncias auferidas em virtude da assunção de obrigações de não concorrência e 4) as indemnizações devidas por renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a bens imóveis, com exceção das indemnizações legalmente devidas pela denúncia de contratos de arrendamento sem termo, relativos a imóveis que constituam habitação permanente do sujeito passivo, nos casos previstos no artigo 1101.º do Código Civil.
São igualmente considerados incrementos patrimoniais as manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados.
As mais-valias são tributadas em sede de categoria G, sendo objeto de tratamento no CIRS, e constituem ganhos resultantes da alienação de um bem económico, desde que este não seja afeto a uma atividade empresarial. Caso seja afeto a uma atividade empresarial, o universo de mais-valias tributável em sede de categoria B é suscetível de abranger um maior universo de ganhos, uma vez que se tributam os ganhos obtidos com a alienação do ativo fixo, seja este composto por tangíveis ou intangíveis, afetos à atividade produtiva, bem como os ganhos resultantes de transferências para o património dos empresários de quaisquer tipo de bens, à exceção de bens imóveis e outros ganhos e perdas suscetíveis de serem qualificados como mais-valias que sejam tributados em sede de categoria B por força do poder de atração desta categoria.[1]
As mais-valias são uma concretização do princípio da tributação do rendimento acréscimo, ou seja, tributa-se não só o rendimento que tem por fonte geradora uma atividade produtiva, mas também os acréscimos patrimoniais de carácter fortuito que tiveram por origem fatores externos e não resultam propriamente do esforço produtivo do sujeito passivo, os quais são também manifestações de capacidade contributiva e, como tal, tributados.
Pese embora o CIRS não proceda a uma definição concreta do conceito de mais-valias, o elenco ora contemplado no diploma é um elenco taxativo, tendo o legislador, quanto a esta matéria, optado por enumerar as situações em que se verifica a existência de um ganho suscetível de ser qualificado como mais-valia através de uma lista exaustiva.
São consideradas mais-valias: 1) a alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e a cessão onerosa de posições contratuais ou direitos inerentes a contratos relativos a bens imóveis – sendo estas mais-valias imobiliárias; 2) a alienação onerosa de partes sociais e de outros valores mobiliários, incluindo a remição e amortização com redução de capital de partes sociais; 3) a extinção ou entrega de partes sociais das sociedades fundidas, cindidas ou adquiridas no âmbito de operações de fusão, cisão ou permuta de partes sociais; 4) o valor atribuído em resultado da partilha, bem como em resultado da liquidação, revogação ou extinção de estruturas fiduciárias aos sujeitos passivos que as constituíram; 5) o reembolso de obrigações e outros títulos de dívida; 6) o resgate de unidades de participação em fundos de investimento e a liquidação destes fundos; 7) a alienação onerosa da propriedade intelectual ou industrial ou de experiência adquirida no setor comercial, industrial ou científico, quando o transmitente não seja o seu titular originário; 8) a cessão onerosa de posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a bens imóveis; 9) as operações relativas a instrumentos financeiros derivados; 10) as operações relativas a warrants autónomos, quer o warrant seja objeto de negócio de disposição anteriormente ao exercício ou quer seja exercido, neste último caso independentemente da forma de liquidação; 11) as operações relativas a certificados que atribuam ao titular o direito a receber um valor de determinado ativo subjacente; 12) a cessão onerosa de créditos, prestações acessórias e prestações suplementares; 13) a afetação de quaisquer bens do património particular, com exceção dos bens imóveis, a atividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário; 14) a cessão onerosa de direitos sobre estruturas fiduciárias, incluindo a cessão onerosa da posição de beneficiário e 15) a alienação onerosa de criptoativos que não constituam valores mobiliários.
À exceção das mais-valias imobiliárias e dos ganhos decorrentes da alienação onerosa da propriedade intelectual ou industrial ou de experiência adquirida no setor comercial, industrial ou científico, todas as restantes correspondem a mais-valias mobiliárias.
Relativamente às mais-valias imobiliárias, estão incluídas no conceito de direitos reais, não apenas o direito de propriedade, como também as suas figuras menores e parcelares, tais como o usufruto, o direito de superfície e o direito real de habitação periódica. Já a cessão onerosa destes direitos é também ela tributável na medida em que seja apurada a existência de um ganho. Tal pode suceder, por exemplo, na situação em que um promitente comprador cede a título oneroso a sua posição contratual por um montante superior ao valor de aquisição.
Por força do princípio da realização, são apenas tributadas as mais-valias realizadas, e não as mais-valias latentes. No entanto, para efeitos de determinação do momento em que tais rendimentos são sujeitos a tributação, importa ter em conta, geralmente, o momento da prática do ato, pese embora existam situações para as quais a lei prevê um momento de tributação diferente: a título exemplificativo, nos casos de promessa de compra e venda ou de troca, presume-se que o ganho é obtido logo que verificada a tradição ou posse dos bens ou direitos. Note-se que o conceito de tradição para efeitos fiscais atinge um espectro temporal superior comparativamente ao conceito de tradição dado pelo Direito Civil.[2]
Quanto à afetação de quaisquer bens do património particular a atividade empresarial e profissional, o ganho só se considera obtido no momento da ulterior alienação onerosa dos bens em causa ou da ocorrência de outro facto que determine o apuramento de resultados em condições análogas. Também no que respeita aos contratos de permuta de bens presentes por bens futuros, a tributação apenas ocorre no momento da celebração do contrato que formaliza a aquisição do bem futuro, ou no momento da sua tradição, se anterior.
A tributação em sede de categoria G comporta um regime transitório, previsto no artigo 5.° do DL n.° 442-A/88, de 30 de novembro. A consagração de um regime transitório deve-se em razão do Código do Imposto de Mais-Valias, o diploma que antecedeu o CIRS, não contemplar no seu âmbito de incidência alguns factos tributários previstos no CIRS. Consequentemente, apenas constituem mais-valias tributáveis em sede de IRS, as que resultarem de ganhos obtidos com a alienação onerosa de bens ou direitos cuja aquisição teve lugar após a entrada em vigor do CIRS, excetuando-se os terrenos para construção, os quais já eram tributados no âmbito do Imposto de Mais-Valias.
As mais-valias imobiliárias são suscetíveis de se encontrarem excluídas de tributação, caso sejam reinvestidas, total ou parcialmente, na aquisição de outro imóvel afeto a habitação própria e permanente. Trata-se de um regime que visa atenuar os efeitos da tributação incidentes sobre a mudança de habitação, permitindo que os ganhos provenientes da venda da habitação anterior, deduzida a eventual amortização de empréstimo que tenha lugar, possam ser reinvestidos na aquisição de nova habitação própria e permanente sem que a carga fiscal constitua um entrave a essa mesma aquisição.
Para que tal suceda, torna-se necessário obedecer a determinados critérios impostos por lei, os quais definem as condições para que os ganhos provenientes da alienação onerosa de imóvel destinado a habitação própria e permanente possam ser reinvestidos e beneficiem da isenção.
Existem três tipos de reinvestimento: 1) para efeitos de aquisição de imóvel; 2) para efeitos de aquisição de terreno para construção e/ou construção e 3) para efeitos de ampliação ou melhoramento de imóvel, sendo que qualquer um destes terá necessariamente de consubstanciar uma aquisição para efeitos de habitação própria e permanente do sujeito passivo e do seu agregado familiar. Cada tipo de reinvestimento ora enunciado possui condições e prazos específicos. Outras formas alternativas de reinvestimento surgiram em 2019, sendo possível o reinvestimento do ganho obtido em virtude da alienação na aquisição de produtos financeiros, nomeadamente seguros financeiros do ramo vida, adesão individual a fundo de pensões aberto ou contribuição para regime público de capitalização. Estas formas de reinvestimento podem também ser complementares face ao reinvestimento na aquisição de um imóvel. Contudo, apenas poderão beneficiar delas os sujeitos passivos com idade igual ou superior a 65 anos ou respetivos cônjuges ou unidos de facto.
O imóvel adquirido poderá situar-se em Portugal ou em qualquer Estado-Membro da UE ou EEE, desde que, neste último, haja intercâmbio de informações em matéria fiscal.
Para efeitos de apuramento de uma mais-valia imobiliária deverá ser subtraído ao valor de realização o respetivo valor de aquisição (cujo cálculo varia conforme o tipo de transmissão que serviu de base à aquisição). A fixação do valor de realização e de aquisição é efetuada com recurso a diferentes critérios, conforme a tipologia da mais-valia, a natureza da aquisição, entre outros. O valor de aquisição é suscetível de estar sujeito a correções monetárias.
Ao valor de aquisição acrescem as despesas e encargos incorridos com o imóvel, nomeadamente encargos com a valorização dos bens (comprovadamente realizados nos últimos 12 anos) e despesas necessárias e efetivamente suportadas, inerentes à aquisição e alienação. Ao acrescerem ao valor de aquisição, reduzem o valor da mais-valia.[3]
O saldo positivo será considerado uma mais-valia, ao passo que o saldo negativo irá ser qualificado como uma menos-valia. O saldo negativo pode ainda ser reportado para os 5 anos subsequentes, em 50% do seu valor.
Para efeito de apuramento dos ganhos ou perdas totais a título de mais-valias ou menos-valias ao longo de um ano, tem-se em conta o saldo apurado entre mais-valias e menos-valias auferidas nesse ano.
Caso o valor de realização seja inferior ao valor patrimonial tributário do imóvel alienado, a tributação incide sobre o valor patrimonial tributário. Já no que respeita à cessão onerosa de posições contratuais ou direitos reais sobre imóveis, o apuramento do ganho ou perda é efetuado com base na diferença entre a importância recebida pelo cedente e o valor de aquisição dos bens ou direitos posteriormente cedidos.
Para residentes fiscais em Portugal e também não residentes, a tributação das mais-valias imobiliárias incide em apenas 50% do seu valor e é de englobamento obrigatório, salvo nas situações em que os imóveis tenham beneficiado de apoio não reembolsável concedido pelo Estado ou outras entidades públicas (dentro de determinadas condições e limites temporais), sendo tributadas na sua integralidade. A tributação das mais-valias auferidas em território português por não residentes tratou-se de uma questão largamente debatida, por se considerar que os não residentes eram sujeitos a um tratamento discriminatório, o qual comprometia a liberdade de circulação de capitais consagrada no TFUE. Com efeito, enquanto os residentes beneficiavam do regime de tributação em apenas 50% do valor da mais-valia imobiliária, o qual seria englobado e sujeito a taxas progressivas, os não residentes eram tributados à taxa de 28%, a qual incidia sobre o valor total da mais-valia, resultando numa carga tributária superior, existindo apenas como alternativa a opção pela tributação como residente, sendo tributado pela totalidade dos rendimentos obtidos dentro e fora do território português. A eliminação do regime alternativo e da taxa especial de 28% incidente sobre a totalidade da mais-valia constituiu um importante marco na resolução da situação discriminatória e ofensiva dos princípios do TFUE, ao implementar um regime equivalente para residentes e não residentes, que podem assim beneficiar da tributação da mais-valia em 50% do seu valor em situação de igualdade.
Para o cálculo das mais-valias mobiliárias, tem-se em conta o saldo apurado entre as mais-valias e menos valias realizadas ao longo do ano. O apuramento da mais-valia imobiliária tem por base a diferença entre o valor de transmissão (valor de realização) e o valor de aquisição. O valor de realização pode ser corrigido pela AT mediante presunção. Em caso de divergência sobre o valor de alienação de ações ou outros valores mobiliários, presume-se que: no caso de valores mobiliários cotados em bolsa de valores, o valor de alienação é o da respetiva cotação à data da transmissão ou, em caso de desconhecimento desta, o da maior cotação no ano a que a mesma se reporta. Não estando cotados em bolsa de valores, o valor de alienação é o que lhe corresponder, apurado com base no último balanço.
Relativamente às quotas, presume-se que o valor de alienação é o que àquelas corresponda, apurado com base no último balanço. Para os criptoativos, o valor de mercado à data da alienação.
Já no que respeita ao valor de aquisição, este varia conforme a aquisição tenha sido a título oneroso ou gratuito, e conforme a natureza da mais-valia (partes sociais, warrants autónomos e certificados cotados em mercado regulamentado, bens ou direitos referidos em uma categoria específica, valores mobiliários adquiridos através do exercício de warrants autónomos de compra, valores mobiliários, bens ou direitos sobre valores mobiliários subscritos por trabalhadores no âmbito de uma relação laboral). O valor de aquisição é corrigido pela aplicação de coeficientes para o efeito aprovados por portaria do Governo, sempre que tenham decorrido mais de 24 meses entre a data da aquisição e a data da alienação ou afetação.
As mais-valias mobiliárias estão sujeitas à taxa de tributação autónoma de 28%, incidente sobre a totalidade do seu valor. Contudo, as mais-valias resultantes da alienação de partes sociais ou outros valores mobiliários relativos a micro e pequenas empresas, tal como definidas por DL, quando positivo, é igualmente considerado em 50 % do seu valor.
São admitidas deduções de perdas, as quais podem ser reportadas para os cinco anos seguintes, quando o sujeito passivo opte ou seja obrigado a englobar esses rendimentos, não existindo comunicabilidade de reporte de perdas entre mais-valias mobiliárias e imobiliárias. O englobamento obrigatório ocorre quando a mais-valia tenha origem na alienação de ativos detidos por um período inferior a 365 dias e o sujeito passivo tenha um rendimento coletável igual ou superior ao valor do último escalão do IRS.
Por fim, as mais-valias referentes a propriedade intelectual e industrial resultam da diferença positiva entre o valor de realização e o valor de aquisição, sendo o saldo entre mais-valias e menos valias apurado anualmente. O saldo negativo, apurado num determinado ano, pode ser reportado para os cinco anos seguintes quando o sujeito passivo opte ou seja obrigado a englobar esses rendimentos.
São tributadas à taxa autónoma de 28%, sendo o saldo positivo para residentes considerado em apenas 50% do seu valor e admite dedução das despesas necessárias e efetivamente suportadas, inerentes à sua respetiva aquisição e alienação.
[1] Pereira, P. R. (2019). Manual de IRS - 2ª edição. Almedina, 240.
[2] Pereira, P. R. (2019). Manual de IRS - 2ª edição. Almedina, 242.
[3] Pereira, P. R. (2019). Manual de IRS - 2ª edição. Almedina, 267.
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