Fiscalidade ▸ Rendimentos de capitais, rendimentos prediais e incrementos patrimoniais
Rendimentos prediais
Por forma a melhor compreender o funcionamento da tributação dos rendimentos prediais importa, para este efeito, percorrer algumas noções introdutórias. Em primeiro lugar, o conceito de prédio diverge do conceito de prédio tal como definido nos termos do nosso Código Civil. Com efeito, o conceito de prédio ora relevante encontra-se previsto no artigo 2.° do Código do CIMI, e consta como um conceito bem mais abrangente que o conceito adotado pelo Código Civil.
Nos termos do artigo 2.°/1 do CIMI, um prédio para efeitos fiscais será “toda a fração de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência (...) e tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções (...) dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fração de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial”. Por sua vez, cada fração autónoma no regime de propriedade horizontal é um prédio para efeitos fiscais (2.°/3 do CIMI) e também os edifícios e construções móveis são suscetíveis de serem considerados prédios quando assentes no mesmo local por um período superior a um ano (critério da permanência). A parte final desta definição é confirmada pelo CIRS, que exige também o carácter de permanência para efeitos de tributação das rendas em sede de IRS, por referência ao mesmo período de 12 meses (a questão do critério da permanência como critério determinante não é pacífica na doutrina, veja-se, a este propósito e contra a aplicação deste critério, Morais (2016)[1] . Com argumentos a favor, Pereira (2019).[2]
Outro conceito importante a reter será o conceito de renda. A renda é um elemento constitutivo do contrato de arrendamento[3], consistindo na prestação pecuniária de carácter periódico devida como contrapartida pelo uso e fruição do imóvel. Todavia, a definição de renda para efeitos fiscais é muito mais ampla, abrangendo uma realidade que transcende o conceito de renda, tal como este é preconizado pelo nosso Código Civil. O legislador procurou, através do artigo 8.° do CIRS, incluir outras realidades que vão para além da mera prestação pecuniária, por forma a evitar situações de elisão fiscal. Assim sendo, são também tidas como rendas: 1) as importâncias relativas à cedência do uso do prédio ou parte dele e serviços relacionados com essa cedência; 2) as importâncias relativas ao aluguer de maquinismos e mobiliários instalados no imóvel locado; 3) a diferença (positiva), auferida pelo sublocador, entre a renda recebida do subarrendatário e a paga ao senhorio; 4) as importâncias relativas à cedência do uso, total ou parcial, de bens imóveis, para quaisquer fins especiais, designadamente publicidade; 5) as importâncias relativas à cedência do uso de partes comuns de prédios em regime de propriedade horizontal; 6) as importâncias relativas à constituição, a título oneroso, de direitos reais de gozo temporários, ainda que vitalícios, sobre prédios rústicos, urbanos ou mistos; 7) as indemnizações que visem compensar perdas de rendimentos desta categoria e 8) as importâncias relativas aos contratos de direito real de habitação duradoura.
Note-se que a lei refere importâncias, pelo que não se encontram excluídas as rendas pagas em espécie.
Os rendimentos prediais têm origem no imóvel, que consubstancia assim a fonte produtora do rendimento[4] e são tributados em sede de categoria F de IRS, sem prejuízo da opção pela tributação dos mesmos segundo o regime instituído para a categoria B. Para esse devido efeito, torna-se necessária a afetação do património predial à atividade desenvolvida em sede de categoria B.
Tais rendas são sujeitas a tributação no momento em que são colocadas à disposição dos seus titulares e beneficiam de deduções específicas desta categoria.
O IRS consagra atualmente o princípio da comprovação documental dos gastos a deduzir, pese embora o elenco de gastos dedutíveis seja relativamente amplo, atenta a redação legal constante do artigo 41.° do CIRS.
Por conseguinte, aos rendimentos brutos obtidos em sede de categoria F são dedutíveis todos os gastos e despesas, na medida em que consubstanciem gastos relacionados com obras de conservação e manutenção do imóvel, e que sejam efetivamente suportados pelo sujeito passivo e suscetíveis de serem documentalmente comprovados.
No que respeita à propriedade horizontal, são também dedutíveis, relativamente a cada fração ou parte de fração, os encargos suportados pelo condómino e que sejam efetivamente pagos. Na eventualidade do sujeito passivo ser proprietário de várias frações autónomas no mesmo prédio, o cálculo da dedução será efetuado com recurso a uma imputação de acordo com a permilagem atribuída a cada fração.
Também o IMI e o IS são dedutíveis aos rendimentos prediais brutos obtidos no mesmo ano em que tais impostos foram suportados.
Por fim, a lei permite a dedução das despesas e gastos incorridos e pagos nos 24 meses anteriores ao início do arrendamento e relativas a obras de conservação e manutenção do prédio para efeitos de arrendamento.
Ficam excluídos da regra da dedutibilidade gastos de natureza financeira, gastos relativos a depreciações, aquisições de mobiliário, artigos de conforto e decoração, bem como o adicional do IMI (AIMI). Todavia, há que considerar que tais gastos serão suscetíveis de serem deduzidos caso o sujeito passivo opte por ser tributado segundo as regras estabelecidas para a categoria B, no âmbito do regime de contabilidade organizada (vigore este de forma opcional ou por força de imposição legal, em razão volume de faturação).
Não beneficiam de deduções, os rendimentos prediais correspondentes ao saldo positivo entre a renda recebida e a renda paga pelo sublocador.
Por sua vez, o AIMI é suscetível de ser deduzido à coleta de IRS, nos termos do CIMI, em determinadas condições aí previstas.
Já no que respeita ao englobamento, desde 2013 que os rendimentos prediais deixaram de ser obrigatoriamente englobados, sendo possível a sua tributação à taxa especial atualmente fixada em 28%, ou opção pelo englobamento. Esta taxa pode ser mais reduzida diante de contratos de arrendamento de duração superior: aos contratos de arrendamento para habitação permanente com duração igual ou superior a 10 anos e inferior a 20 anos é aplicada uma redução de 15 pontos percentuais na respetiva taxa autónoma; aos contratos de arrendamento para habitação permanente com duração igual ou superior a 20 anos e aos rendimentos prediais decorrentes de contratos de direito real de habitação duradoura, na parte respeitante ao pagamento da prestação pecuniária mensal, é aplicada uma redução de 20 pontos percentuais da respetiva taxa autónoma.
Os rendimentos prediais decorrentes de arrendamento habitacional, incluindo os referidos na alínea b) do n.º 5 do artigo 8.º, são tributados à taxa autónoma de 25%.
Ao passo que a opção pelo englobamento determina a tributação do rendimento global do sujeito passivo, sendo o mesmo sujeito a taxas progressivas e beneficiando das características personalizantes deste mesmo mecanismo, tais como as deduções à coleta e o quociente conjugal, a tributação à taxa autónoma incide unicamente sobre rendimento global líquido da categoria F, assegurando a tributação final na sequência da liquidação efetuada com base na declaração do sujeito passivo.
A admissibilidade de dedução de gastos não se encontra subordinada à opção pelo englobamento. Desta forma, podem os rendimentos prediais sujeitos a taxa liberatória beneficiarem igualmente das deduções específicas da presente categoria.
Caso seja apurado um resultado líquido negativo, este poderá ser deduzido aos resultados líquidos positivos dos anos seguintes, durante um prazo máximo de 6 anos. O direito ao reporte do resultado líquido previsto obedece a um requisito de continuidade de geração de rendimentos[5]. Neste sentido, o direito ao reporte fica sem efeito quando os prédios a que os gastos digam respeito não gerem rendimentos da categoria F em pelo menos 36 meses, seguidos ou interpolados, dos cinco anos subsequentes àquele em que os gastos foram incorridos.
Tal como sucede relativamente às deduções específicas, também o reporte de perdas é admitido caso não se opte pelo englobamento.
Os rendimentos prediais estão sujeitos a retenção na fonte com natureza de adiantamento por conta do imposto sempre as rendas forem pagas por sujeitos passivos que possuam contabilidade organizada. Neste caso, o devedor das rendas é o substituto tributário, sendo este responsável pelas importâncias retidas, as quais deverão ser entregues aos cofres do Estado. No entanto, estão dispensados de retenção na fonte os rendimentos da categoria F, quando o respetivo titular preveja auferir, em cada uma das categorias, um montante anual inferior ao fixado no n.º 1 do artigo 53.º do Código do IVA.
Os titulares de rendimentos da categoria F estão obrigados a passar recibo de quitação, em modelo oficial, de todas as importâncias recebidas dos seus inquilinos, pelo pagamento das rendas, ainda que a título de caução, adiantamento ou reembolso de despesas ou a entregar à Autoridade Tributária e Aduaneira uma declaração de modelo oficial que discrimine os rendimentos mencionados na alínea anterior até ao fim do mês de janeiro de cada ano, por referência ao ano anterior.
[1] Morais, R. D. (2016). Sobre o IRS - 3ª edição. Almedina, 111.
[2] Pereira, P. R. (2019). Manual de IRS - 2ª edição. Almedina, 181.
[3] Pereira, P. R. (2019). Manual de IRS - 2ª edição. Almedina, 182.
[4] Pereira, P. R. (2019). Manual de IRS - 2ª edição. Almedina, 178.
[5] Pereira, P. R. (2019). Manual de IRS - 2ª edição. Almedina, 198.
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